Fundos de energia viram prejuízo bilionário e levantam suspeitas contra banco
Credit Suisse estruturou papéis de empresas em crise e vendeu a investidores
Por: Iago Bacelar
07/08/2025 • 08:42
Dois fundos estruturados e vendidos pelo Credit Suisse, hoje incorporado ao UBS, causaram prejuízo de R$ 1,6 bilhão a investidores. Os papéis eram ligados às empresas 2W Energia e Rio Alto Energias Renováveis, que entraram em recuperação judicial após perderem valor de mercado. Investidores alegam que o banco omitiu informações relevantes sobre os riscos e o histórico dos fundadores das companhias.
Atuação do banco e conflito de interesses
O banco recebeu quase R$ 50 milhões das duas empresas para estruturar os fundos Wave e Solar, ao mesmo tempo em que vendia cotas dos mesmos papéis a seus clientes. As comissões, equivalentes a 5% das debêntures, geraram R$ 27,5 milhões da Rio Alto e R$ 20 milhões da 2W. Investidores afirmam que essa atuação dupla cria conflito de interesses.
O fundo Wave, vinculado à 2W, emitiu R$ 555 milhões em debêntures. Já o fundo Solar, ligado à Rio Alto, lançou R$ 400 milhões em títulos. Com a correção dos juros, o valor chega a R$ 1,6 bilhão. Após sucessivas quedas no valor dos papéis, investidores relatam perdas de até 97,7%.
Fundador da 2W foi alvo da PF
Ricardo Delneri, fundador da 2W, foi denunciado na Operação E o Vento Levou, por envolvimento em esquema de propina com a estatal Cemig, em 2014. À época, contratos foram superfaturados para viabilizar o pagamento de R$ 40 milhões a dirigentes da empresa.
Mesmo após esse histórico, o Credit Suisse estruturou o fundo Wave, em 2021, com base na empresa de Delneri. O material de distribuição não mencionava a investigação da Polícia Federal nem o rombo de R$ 3,1 bilhões na Renova Energia, empresa anterior do mesmo sócio.
Empresa não cumpriu obrigações e investidores foram surpreendidos
Em 2024, a 2W não apresentou demonstrações financeiras e foi acionada judicialmente por dívida de R$ 3,3 milhões. As negociações com o banco fracassaram após Delneri tentar liberação de garantias. Em maio de 2025, a empresa entrou em recuperação judicial, com dívidas de R$ 2,2 bilhões. Investidores perderam R$ 650 milhões.
Manobras para proteger patrimônio
Em abril de 2024, Delneri transferiu parte de um apartamento de R$ 40 milhões à esposa e um imóvel de R$ 1,5 milhão ao filho. Também registrou como residência uma mansão de R$ 30 milhões em Porto Feliz, tornando-a impenhorável. A juíza do caso entendeu que a ação teve como objetivo blindagem patrimonial.
Caso do fundo Solar envolve ex-investigado da Lava Jato
A Rio Alto foi fundada por três sócios, entre eles Sergio Reinas, investigado pela Lava Jato do Rio por ligação com doleiros. Reinas também foi multado em R$ 104 milhões pela CVM e esteve à frente de projetos eólicos com problemas judiciais que envolvem R$ 680 milhões.
A Rio Alto apresentava sérias dúvidas desde setembro de 2023, conforme relatórios de auditoria. Em fevereiro de 2025, entrou em recuperação extrajudicial, com dívidas de R$ 1,5 bilhão. Investidores relatam que o banco ainda vendia os papéis como se a empresa valesse R$ 1 bilhão, mesmo com os títulos praticamente sem valor.
Reação e posicionamento dos envolvidos
“É muito revoltante você colocar o dinheiro de seu trabalho em uma instituição desse porte e seu dinheiro desaparecer da noite para o dia”, disse ao Metrópoles um investidor do Credit Suisse que pediu para não ser identificado.
Outro cliente afirmou que não foi informado sobre os riscos. “Em nenhum momento fomos avisados de nada. Só descobri o prejuízo quando vi que o dinheiro não estava mais lá”, relatou.
A defesa de Delneri alegou que as garantias eram suficientes para cobrir as obrigações da empresa e que a transferência de bens foi lícita. Também afirmou que os fatos da investigação são de 2014, tramitam em sigilo, e que ele não foi citado.
O UBS, atual controlador do Credit Suisse, declarou que não vai se manifestar. A defesa de Reinas não foi localizada. O espaço segue aberto.
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