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Luto por artistas; fãs se unem para lidar com a dor da perda

Portal Esfera conversou com especialista sobre o tema

Por: Gabriel Pina

04/11/202510:00

Na última semana, um vídeo de uma fã do grupo de música pop One Direction começou a ganhar repercussão nas redes sociais. Na gravação, uma jovem aparece chorando, com a legenda “processo de uma fã que perdeu o ídolo”, referindo-se à morte de um dos membros do grupo, o cantor Liam Payne, que faleceu em outubro de 2024. A publicação, que passou de 1 milhão de visualizações apenas no TikTok, mobilizou os internautas nos comentários, onde muitos consideraram a reação da garota como “exagerada”. Mas será que é possível ficar de luto por conta da perda de um artista querido?

Fã de Rita Lee segurando flor roxa
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Para a psicologia, a resposta é sim. De acordo com a doutora em psicologia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especialista em luto, Dra. Queli Nascimento, uma das abordagens empregadas na psicologia é de que o luto, configurado como uma reação de ressignificação da vida diante da ausência, pode surgir a partir da morte de uma personalidade pública.

“O luto é uma reação natural e esperada diante do rompimento de um vínculo significativo, que se configura quando algo ou alguém que temos afeto deixa de existir em nossa vida. Essas situações em que a perda de uma pessoa com quem se tinha um vínculo afetivo geram efeitos emocionais, físicos, sociais e até espirituais. Além disso, as pessoas famosas podem gerar sentimentos de intimidade e projeção, isto é, ao serem acompanhadas em sua trajetória de vida artística ou em seu cotidiano, as pessoas podem imaginá-las como amigas ou conhecidas. Nesse sentido, a notícia da morte pode chegar carregada com uma grande carga e dor emocional”, afirmou Queli.

Imagens: Reprodução/TikTok @larathame

Outro fator apontado pela especialista são os meios de divulgação, como as redes sociais, que atuam no aumento do choque em relação a notícia da morte de personalidades famosas, provocado pela circulação de informações e notícias, fazendo com que o assunto ganhe uma maior proporção e impacto no emocional.

“As redes sociais são espaços que podem auxiliar ou gerar mais sofrimento, no sentido de que funcionam como espaços de expressão dos sentimentos. Dessa forma, ao trazer para a esfera pública as expressões do luto através das redes sociais, a exposição pode gerar críticas, ridicularização e minimização da dor da perda. No entanto, ao sentir que suas dores expressas são validadas, as pessoas podem perceber que estão conectadas e, desta forma, recebem apoio de outros desconhecidos, mas semelhantes nesta dor e apoio mútuo”.

Destacou a profissional, que completou:

“Essa vivência comum pode levar a uma sensação de pertencimento que vai se manifestar por ações e rituais compartilhados. Por exemplo, se a morte acontece em um local específico, é comum as pessoas levarem fotos, flores e velas para aquele mesmo lugar, podendo se repetir por anos. Além disso, fazer vigílias ou encontros de grupos para cantar juntos a música de um artista. Com isso, a experiência privada de sofrimento frente à perda também é atravessada por essa ação compartilhada e auxilia no processo do luto".

Fãs na fila do velório da cantora Rita Lee. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Fãs na fila do velório da cantora Rita Lee. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil


Dessa forma, as chamadas fanbases, comunidades de fãs nas redes sociais, possuem papel chave para o processo de luto em relação à morte de artistas. Em conversa com o Portal Esfera, as administradoras da fanbase Onedbbrasil, um dos principais perfis dedicados ao grupo no Brasil, Karen, Maria Rita, Beatriz e Larissa, revelaram que, para além da perda do ídolo, elas precisaram refletir sobre como lidar com as múltiplas emoções dos fãs do One Direction com o falecimento de Payne.

“Apesar do choque e dor pela perda, tínhamos que seguir em frente para manter a história, legado e o nome do Liam vivo. Não só em nossas memórias, mas nos corações de todos do fandom. Além de ser um jeito de abraçarmos outros fãs, de mostrarmos e darmos nosso apoio para eles, ‘estamos com vocês, compartilhamos essa dor’”, afirmou Karen.

Já para Larissa, uma das preocupações que surgiram foi sobre posicionar a fanbase como um local para que os fãs da banda se sentissem acolhidos.

"Tentamos criar um espaço seguro para quem quisesse desabafar. Abrimos caixinhas para os fãs mandarem mensagens, organizei uma homenagem com fotos e textos e fiquei disponível para conversar com quem estivesse precisando. Queríamos que ninguém se sentisse sozinho nesse momento”, ressaltou.

Além disso, apesar de ter se passado mais de um ano da morte de Liam Payne, as administradoras da Onedbbrasil destacam que a perda do cantor ainda é um assunto presente nos comentários dos fãs.

Até hoje recebemos mensagens de fãs relatando sua dor, contando até hoje. O falecimento do Liam foi algo dilacerante. Infelizmente, é algo que nós, fãs, carregaremos para sempre”, afirmou Maria Rita.

Foto: Reprodução/Instagram @onedbbrasil

Foto: Reprodução/Instagram @onedbbrasil


A doutora Queli avalia que o processo de sofrimento pela perda de um artista querido pode, naturalmente, se estender. No entanto, é necessário recorrer a outras formas de suporte para lidar com a dor.

“O luto é uma forma de honrar a vida daquele que partiu. A reação à perda está associada ao sentimento de grande carinho, amor e cuidado por quem se afeiçoou. E validar a experiência da perda que pode chegar com sentimentos desagradáveis como choro, tristeza e angústia é a demonstração da dimensão desse afeto. Vale lembrar que, se esses sentimentos não descansam, é preciso buscar ajuda profissional para entendê-los melhor”, completou.

Foto: Reprodução/Instagram @onedbbrasil

Foto: Reprodução/Instagram @onedbbrasil


Ainda estamos tristes com isso e será uma dor que não vai sumir. Mas, aprendemos a viver com ela. Em tempos atuais, gostamos de fazer homenagens ao Liam e de como ele foi uma grande pessoa. Sempre teremos um pedaço dele conosco”, concluiu Beatriz.