Educação integral: caminho para melhores resultados no Enem
Diferença de até 134 pontos na redação é registrada no Nordeste
Por: Lorena Bomfim
28/08/2025 • 10:26 • Atualizado
Uma pesquisa do Instituto Sonho Grande revelou que estudantes de escolas estaduais que oferecem Ensino Médio Integral (EMI) tiveram desempenho superior no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2024, em comparação aos alunos de unidades de turno parcial.
Para ser considerada integral, a escola deve oferecer carga horária mínima de sete horas diárias ou 35 horas semanais. A análise, feita a partir dos microdados do Enem — aplicado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) —, mostra que a maior diferença está na prova de redação. Em média, estudantes do EMI obtiveram 12 pontos a mais que os demais. Nas escolas em que 100% das matrículas são integrais, a diferença sobe para 27 pontos. Em matemática e suas tecnologias, o desempenho também foi melhor: cinco pontos acima em relação às escolas regulares.
A diretora-executiva do Instituto Sonho Grande, Ana Paula Pereira, defendeu que a ampliação do ensino integral reflete diretamente na qualidade da aprendizagem.
“Esses dados confirmam o que outras pesquisas já apontavam: estudantes do ensino médio integral aprendem mais do que os de tempo parcial”, afirmou à Agência Brasil.
Nordeste lidera matrículas em tempo integral
Segundo o Censo Escolar 2024, os estados com maior proporção de alunos matriculados em tempo integral estão no Nordeste: Pernambuco (69,6%), Ceará (54,6%), Paraíba (54,5%), Piauí (54,1%) e Sergipe (35,2%). Na outra ponta, o Distrito Federal (6,4%) e Roraima (8,1%) registram os menores índices.
Na região, o desempenho também se destacou. Alunos de escolas integrais tiveram, em média, 18 pontos a mais na nota geral do Enem e 48 pontos a mais na redação em relação aos de turno parcial. Em Pernambuco, onde a política já está consolidada, estudantes de escolas 100% integrais alcançaram média 68 pontos superior na redação. Já no Ceará, a diferença chega a 134 pontos. Entre as 100 escolas cearenses com maiores notas no exame, 98 oferecem ensino integral.
Para Ana Paula Pereira, esses resultados são fruto da prioridade dada ao modelo ao longo dos anos. “Os governadores colocaram o integral como agenda central, garantindo planejamento consistente, formação de professores e acompanhamento pedagógico contínuo. Assim, o modelo deixou de ser pontual e se consolidou em larga escala, gerando impacto coletivo”, destacou.
Mais participação no Enem
Outro levantamento, realizado pelos economistas Naercio Menezes Filho e Luciano Salomão em parceria com o Instituto Natura, reforça os resultados. O estudo mostrou que alunos de escolas integrais têm 16,5% mais participação no Enem do que os de meio período. Além disso, alcançam notas mais altas, principalmente em redação, com diferença de 29 pontos.
Para a superintendente de Políticas Educacionais do Instituto Natura, Maria Slemenson, o modelo é uma das políticas públicas mais promissoras do país. “O ensino médio integral é um caminho estratégico para construir uma sociedade mais próspera e justa”, afirmou.
Ana Paula Pereira acrescenta que os benefícios vão além da aprendizagem: estudantes dessas escolas têm mais chances de ingressar no ensino superior e no mercado de trabalho, além de conquistarem empregos mais qualificados e salários mais altos. Pesquisas também indicam redução de violência, desnutrição, gravidez na adolescência, transtornos de comportamento e abuso de substâncias.
“Quando olhamos para esse conjunto de evidências, fica claro que o Ensino Médio Integral não é apenas uma política educacional, mas uma estratégia de desenvolvimento social e econômico para o Brasil”, avaliou.
Desafios e perspectivas
Apesar dos avanços, o país ainda está abaixo das metas. Entre 2022 e 2024, o percentual de matrículas em tempo integral na educação básica passou de 18,2% para 22,9%, abaixo da meta de 25% prevista no Plano Nacional de Educação (PNE). No ensino médio, o índice saltou de 14,1% para 24,2% no mesmo período.
Para a consolidação da política, a diretora do Instituto Sonho Grande aponta três desafios principais:
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Financiamento contínuo — com apoio de programas federais, como o Escola em Tempo Integral, e repasses diferenciados do Fundeb.
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Apoio a estudantes vulneráveis — por meio de benefícios financeiros, como o Programa Pé-de-Meia do MEC, que estimulam a permanência dos jovens.
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Planejamento das redes estaduais — reorganizando estruturas e garantindo expansão consistente.
Programa Escola em Tempo Integral
Lançado em 2023 pelo Ministério da Educação (MEC), o programa prevê até 2026 a criação de 3,2 milhões de novas matrículas em tempo integral em todas as etapas da educação básica. O objetivo é promover o desenvolvimento integral dos estudantes e elevar os indicadores nacionais de aprendizagem.
Para Ana Paula Pereira, a política federal é essencial para consolidar o modelo no país. “Essas iniciativas garantem estabilidade à educação integral e ajudam a transformá-la em política de Estado, menos sujeita à descontinuidade. Além disso, posicionam o ensino integral como prioridade nacional”, destacou.
A especialista defende, no entanto, que a meta brasileira para 2035 seja mais ambiciosa: pelo menos 50% das matrículas e 70% das escolas em tempo integral, com prioridade para estudantes mais vulneráveis. Ela alerta ainda que a simples ampliação da carga horária não basta.
“O diferencial está em um modelo pedagógico que crie um ambiente acolhedor, no qual o jovem se reconheça e encontre sentido para aprender”, concluiu.